quinta-feira, 25 de setembro de 2008

Assalto


Há algo que se perde para sempre dentro de nós. Aquele instante em que o tempo toma uma velocidade furiosa e nos torna reféns do nosso capricho interior é avassalador.

Vai haver sempre aquela descida, aquele ímpeto em meu redor, aquelas criaturas vestidas de mal e parte da minha vida a ser levada, numa mala azul, em fuga.

A intromissão foi determinante na minha escolha posterior em não voltar a ser mais invadido do que já tinha sido. Continuo, no entanto, a ser assaltado por aquelas recordações roubadas. Não me assusta voltar lá como nos primeiros dias mas mantenho reserva na minha propriedade.

Sublinho a privacidade e a privação.

Apercebo-me que são conceitos muito meus, muito unidos desde aquele dia, faz hoje há dois anos. Ironicamente unidos, na separação.
Este momento permitiu-me não só ser menos ligado aos bens materiais como acrescentar convicções ao meu Will.
Aceitei a derrota e ganhei com isso.

terça-feira, 27 de maio de 2008

The Match


O início é sedutor.

"Se a vida começar aqui já começou bem.
Querendo começar qualquer coisa, qual o primeiro passo?
O truque esteve sempre aqui: o primeiro e o segundo passo. O primeiro porque envolve toda a (in)definição e o segundo como a confirmação do caminho.
A espaços vamos pensar no princípio, no tempo de entregas generosas. Como o sorriso que doamos para que outros sintam o valor dele e o emoldurem mentalmente, na nossa memória fragmentada
.” (Will)

Eu imagino A Montanha.
Foco-me na chegada, na vitória, e os movimentos concêntricos espalham-se ao longo da ideia. Já não vou querer subir a parada. Não há nada que me incomode mais do que carregar fardos rumo ao topo.

E paro, se calhar, no momento mais improvável.

No início, houve esse sorriso entre nós.
No meio, em mim, há algo que se soma, que se acrescenta ao que fui sendo.
No fim centro-me numa única palavra. Acompanha-me, como um talismã, para toda a parte, adapta-se à minha vida e mantém-me com vida.

Do you match me?

domingo, 27 de abril de 2008

Volta na Vida

Waterfall, 1961, M. C. Escher
[Fonte: pt.wikipedia.org/wiki/M.C._Escher]

Desenhei um círculo na minha vida. Julguei que abarcava todos os motivos para ser feliz mas alguém me mostrou que havia também o vazio.
Cai em mim, no interior da sua ausência, com dor. Aceitei-me condor e decidi que teria que voar. É certo que não voei para muito longe mas senti-me sozinho neste novo caminho. Seria mais um desafio e saltei quando me senti preparado.

Tive, acima de tudo, muita vontade.
Antecipei o início mas tinha de ser a 27. Aconteceu um mês antes quando me acolhi no abrigo que se fez casa.
O que não ritualizei antes faço-o agora. Parece-me a celebração de uma vida normal (Júnior). Agora que olho para trás não posso falar de The Great Escape mas de um contacto que assumi com Free Will, uma espécie de Independência, Lda. que deverá culminar um dia numa sociedade homónima.
Este momento terá sempre a música da Ana Carolina e o orgulho de poder contar-te que voltei. Por muitas voltas que a minha vida me dê não quero voltar a fechar o círculo para poder levar a água ao meu moinho.

sábado, 9 de fevereiro de 2008

Escolher na consciência

The unexpected answer, René Magritte
[Fonte: profile.myspace.com]

Morreu uma mulher grávida na minha rua. Foi atropelada.
Descobri pouco depois que era toxicodependente e que roubava.
Alguém disse, entre a multidão, que era muito boa filha e que cuidava de uma mãe inválida desde os 20 anos.
Vim a saber que estava grávida de apenas 3 semanas.
O passado criminoso desta mulher era conhecido pela polícia há já muito tempo e havia assaltado e agredido idosas. Era negra.
Levava o filho mais velho todos os dias à escola.
Espancava o filho mais novo, tendo este estado internado 2 meses.

Sentem piedade? Sentem raiva?
Acham que “foi bem feita”?
E se vos disser que se suicidou? Que estava cansada da vida que levava?
Não sei se estas informações ajudam a diluir o efeito da morte, do desaparecimento, da história contada por mim, por cada um de nós sobre os outros.

Ando a ler o fantástico livro “Blink”, de Malcolm Gladwell há já várias semanas e é inquietante a forma como tomamos decisões por pormenores, fazendo fé nas impressões que o nosso cérebro recebe nas pequenas coisas, sem que tenhamos muitas vezes consciência desse processo. Gladwell chama-lhe “slice of life”, fatiar fino segundo nota do tradutor.
Esta reflexão sobre a mulher grávida, naturalmente inventada, é fruto da forma como todos nos avaliamos no dia a dia, comentamos os nossos parceiros, colegas ou amigos. Muitas vezes até a nossa cara-metade não escapa a esta incidência.
Poderia escrever sobre a avaliação do bem e do mal e das consequências dos nossos actos e comportamentos mas…ainda ando com a mente às voltas depois de ver o “Atonement”. Aconselho vivamente.
Há sempre um momento em que escolhemos.

Há escolhas que mudam a nossa vida mas...temos de ter consciência disso?